sexta-feira, 19 de novembro de 2010

Preto. Branco. E só.



A MTV Brasil completou 20 anos no mês passado. Mesmo com um certo atraso, é hora de prestar tributo à parte boa do legado da emissora, principalmente sua primeira década, quando o lado visual da música propriamente dita ainda era a sua prioridade.

Há muito tempo o canal mudou de rumos, para pior, mas seus primeiros anos, durante os quais o assistíamos via primitivos conversores UHF, contribuíram em muito para a evolução da estética pop no Brasil pré-internet. Para quem estava começando nesta história de fixação por música, não teve preço. O que chegava até então era escasso, muito escasso, veiculado no “Realce” e depois “Clip Trip”, ambos da xexelenta TV Gazeta com apresentação de um sujeito chamado Beto Rivera e um boneco conhecido como Capi. (Sim, um boneco. E sim, “Capi” de “Capivara”) Aproveito a inauguração da série “memória afetiva videoclípica” para reforçar o time dos Top 10 cujo critério é o videoclipe, coisa que só fiz neste post.

Neste episódio, umas das categorias visuais favoritas do Mala da Lista: os clipes em preto e branco que mais marcaram a sua vida. Não por acaso, vários são do período inicial da “Emitevê”, como diz Caetano Veloso.

10-Leonard Cohen – “First We Take Manhattan” (1988)

É enigmático como a música em si, uma a bizarramente bem-sucedida tentativa de Cohen de fazer dance music. É velho, mas só o conheci recentemente, quando inclusive já havia presenciado Cohen tocando a música num indescritivelmente brilhante show em Barcelona há pouco mais de um ano.



9-Los Hermanos – “Sentimental” (2001)

A ruptura dos Los Hermanos com a febre “Anna Julia” foi além da música. Quando lançaram o surpreendente “O Bloco do Eu Sozinho”, também deixaram de lado os videoclipes convencionais. E se em “Todo o Carnaval tem Seu fim” se metiam em sacos e pulavam em câmera lenta e em “Fingi na Hora de Rir” recorriam à imagens caseiras de uma festa de quinze anos, em “Sentimental” eles quiseram registrar o entediante cotidiano de um pacato cidadão em super 8 e sem cores. O cara toma café na padoca, conversa com o colega de repartição e até abraça uma árvore – é, nem tão entediante assim -, enquanto o mundo desmorona na torturada interpretação da banda. O roteiro é de um dos dois líderes, Rodrigo Amarante.


8-Massive Attack – “Daydreaming” (1991)

Lembro bem que, aos doze anos, ainda não entendia o som do grupo de Bristol. Mas já sabia de alguma maneira que algo sério vinha por ali e apreciava o aspecto artístico do clipe que, além de belo, é histórico por captar a primeira encarnação do grupo, com Tricky (o segundo a rimar, depois de Robert Del Naja) e Shara Nelson.


7-Red Hot Chili Peppers – “Give it Away” (1991)

Já é que para ser nostálgico: ah, como era bom o Red Hot Chili Peppers de 1991. No auge da forma da banda, com o essencial “Bloo Sugar Sex Magik”, recém-lançado, tudo o que eles faziam era legal. Inclusive este inesquecível clipe, que alavancou a carreira do fotógrafo e diretor francês, Stéphane Sednaoui, que depois viria a dirigir outros clássicos, como “Today”, dos Smashing Pumpkins, e “Big Time Sensuality”, de Björk, ambos de 1993.


6-Pet Shop Boys – “Being Boring” (1990)

Bruce Webber, diretor de um dos grandes documentários em PB da música - “Let’s Get Lost” (1989), sobre o jazzista Chet Baker -, cuidou do mais elegante trabalho desta lista. E o mais gay friendly, a julgar pelas bundas masculinas de modelos Calvin Klein que transitam de fora. Detalhe nonsense imperdível: no minuto 2” 49’, um macaco atravessa a sala patinando, vestido em smoking.


5-Depeche Mode “Never Let Me Down Again” (1987)

E já que falamos em diretores que são grife, vamos direto ao maior deles: Anton Corbijn. Aqui, o holandês registra a passagem ao estrelato arty de uma de suas bandas-fetiche, da qual vem assinando quase todos os videoclipes em três décadas de trajetória (vários em PB). Bem ao seu estilo, faz com que a letra - aparentemente sobre um viciado na fissura esperando o traficante - não coincida com as imagens, nas quais um jovem David Gahan toma café com um sósia do humorista Millôr Fernandes.


4-Portishead – “All Mine” (1997)

Tirem as crianças da sala. Eis o possivelmente mais - com o perdão do espanholismo -escalofriante videoclipe já produzido. E ao mesmo tempo um dos mais baratos. Tudo por culpa da jovem e estranhíssima protagonista, uma versão miniatura da vocalista Beth Gibbons (será que é a sua sobrinha? Aí seria definitivamente o mais barato da história) que interpreta de maneira fantasmagórica uma canção já sinistríssima. Uma obra de arte desconcertante.


3-Bob Dylan – “Subterranean Homesick Blues” (1965)

Um dos mais influentes e parodiados videoclipes - o INXS e Weird Al Yancovich parodiou – é na verdade um promo de “Don’t Look Back” fabuloso documentário de D.A. Pennebaker sobre a turnê inglesa que Dylan fez em 1965. Mas mesmo sem querer, entrou para a história por criar um lance assim, super “proposta”, ao invés de simplesmente filmar um artista no palco, como mandava a cartilha da época.

Octagenário e ainda firmão, o Pennebaker marcou presença numa sessão do filme à qual fui há duas semanas aqui em Barcelona. Bem-humorado, foi sincero ao dizer que não lembra de quase nada dos bastidores da lendária produção. Não explicou nem o porquê da presença no clipe do cantor Bob Neuwirth e do maior arroz-de-festa dos poetas beatniks, Allen Ginsberg.


2-Chris Isaak – “Wicked Game” (1991)

Como os torcedores do Santos Futebol Clube, o negócio de Herb Ritts era um “alvinegro praiano”. Afinal, entre as obsessões do falecido diretor e fotógrafo de moda americano estavam os videoclipes filmados em preto e branco e ambientados em praias. Em 1989, emplacara “Cherish”, de Madonna, já com uma certa repercussão. Mas virou o mundo de cabeça para baixo mesmo com este, flagra do eterno amasso de Chris Isaak com a top model dinamarquesa Helena Christensen (em topless), nas areias do Havaí. A própria MTV o consagraria como o clipe mais sexy de todos os tempos.


1-Joy Division – “Atmosphere” (1988)

Em 1980, a música foi usada como trilha sonora pós-aviso do suicídio do Ian Curtis pelo mítico radialista John Peel. Oito anos depois, Anton Corbijn – ele de novo – quis homenagear sua outra banda de estimação com o mais poeticamente dark dos clipes. Acabou concebendo a versão visual do canto do cisne de Curtis proposto por Peel. E, enquanto dirigia misteriosos encapuzados carregando imagens do vocalista, Corbijn provavelmente profetizou: dali a quase 20 anos utilizaria a mesma estética bela e desiludida para a biopic de Curtis, “Control”.


Um comentário:

  1. Uooou! Não conhecia esse clipe do Portshead!Apavorante hahahaha O
    Being Boring é foda, bons tempos
    de MTV. Uma das melhores safras
    selecionadas de clipes, Mala.
    Muito classe.

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