A cobertura das eleições brasileiras pela mídia da Espanha tem sido chôxa, pelo menos em comparação com os últimos pleitos de ex-colônias do país, como Argentina e Colômbia. Mas a cada vez que o assunto é tratado na TV, a imagem de fundo da matéria é a foto de Dilma Roussef de quando foi presa, em 1970, por seu envolvimento com a luta armada contra a ditadura militar.
Mal sabem os ibéricos que na atual conjetura política tupiniquim abundam ex-guerrilheiros, tanto na situação (o Ministro de Comunicação Social Franklin Martins), quanto na oposição (Fernando Gabeira). Também ignoram que a estética do xilindró já foi explorada antes nas paragens verde-amarelas, como nas camisetas que em 2002 circulavam estampadas com a foto de Lula, barbudíssimo, fichado pelo Dops em seus anos de sindicalismo.
Estética essa, aliás, que é bastante familiar ao mundo pop. Por isso, e porque basta de política, resgato aqui alguns astros que quiseram decorar capas de seus álbuns com toques carcerários.
*Passaram no detector de metais do Mala da Lista apenas os casos em que o próprio autor vê, ou está prestes a ver, o sol nascer quadrado. O que exclui capas clássicas como “Crime of the Century”, do Supertramp (que traz apenas mãos e grades flutuando no espaço).
10-Dexter – “Exilado Sim, Preso Não!” (2005)
Entre as celebridades paulistanas que entrevistei em 2003 para o livro “São Paulo de Todos os Sonhos” (falo disso também aqui), o então detento Dexter, que me atendeu por celular – mas é claro -, foi de longe a mais simpática e prestativa, numa prova de que as aparências enganam (e enganam mesmo: a mais arredia e mal-humorada foi a monja budista Coen). Desde junho deste ano, Dexter cumpre em regime semi-aberto sua pena por assalto a mão armada. Terá mais tempo, esperamos, para preparar uma capa melhorzinha para o novo CD, prometido para 2011.
9-Whodini – “Escape” (1984)
Na primeira metade dos anos 1980 o hip-hop ainda vivia sua fase mais naïve pré-gangsta, mas o trio de Nova York já não estava para brincadeira. O mais curioso é que dá pinta de que eles estejam em um zoológico, e que nem sequer se encontrem do lado de dentro da cela/jaula.
8-Racionais MC’s – “Holocausto Urbano” (1990)
O quarteto estreou em disco com uma de suas obsessões, as capas com cadeia. Além desta há a assustadora de “Raio-X do Brasil, de 1993 e a belíssima da coletânea homônima de 1994, mas ambas não incluem Mano Brown, Ice Blue, Edy Rock e KL Jay como personagens.
7-James Brown – “Revolution of the Mind” (1971)
Talvez depois de Dexter, James Brown seja o que tem maior intimidade com o xadrez desta lista. Nada como transformar tal relação na capa de um álbum ao vivo.
6-Bezerra da Silva – “Esse Aí que É o Homem” (1984)
“Meu Bom Juiz”, LP do sambista lançado em 2003, traz ele encarcerado e também vestido de juiz. Mas a arte é tão tosca que preferi este, em que o saudoso malandro acaba de “perder” e está em vias de entrar pelo cano, aparentemente nas mãos do Hermes e do Renato.
5-Public Enemy – “It Takes a Nation of Millions to Hold Us Back” (1988)
Capa clássica de um álbum mais ainda. Que Chuck D, Flavor Flav e rapaziada andaram relendo na íntegra ao vivo, como testemunhei em 2008 aqui em Barcelona. Vai encarar?
4-Mack Vickery – “Live at theAlabama Women’s Prison”
Este contemporâneo obscuro de Johnny Cash, que trocou o rockabilly pelo country, era ousado: se Cash fizera um disco em presídio para homens (“Live at Folsom Prison”, de 1968), Vickery deu um jeito de gravar o seu numa prisão feminina. A capa ficou com pinta de cartaz de filme pornô, mas tudo bem.
3-Floyd McClellan – “I Am An Ex-Convict From A Florida Chain Gang” (1978)
Outra pepita garimpada pelo blog LP Cover Lover, entrou bem neste ranking pelo traje Irmãos Metralha e pelo olhar perdido de McCellan, que parece muito mais carente de um tratamento psiquiátrico do que atormentado pela falta de liberdade.
2-Chico Buarque - “ParaTodos” (1993)
Em 1961, bem antes de começar a escrever canções com metáforas sobre a ditadura que os censores não entendiam, Chico foi preso por roubar um carro com um amigo. As fotos do fichamento não mentem: ele ainda era “di menor”.
1-Ivan Lins – “Nos Dias de Hoje” (1978)
Até tu, Ivan Lins? É a pergunta que não quer calar esta semana. Pois parece que sim, até ele, Ivan Lins, andou trancafiado entre grades. Nos anos 1960 e 1970 o cantor carioca era bastante politizado, fase que gerou a capa mais crua, autêntica e fiel ao espírito desta lista. E tendo como referência o som de churrascaria que o cara vem fazendo desde os 1980 – e ah, como é difícil não levar isso em conta -, imaginar um milico informando, grave, que “capturamos o subversivo Ivan Lins! Capturamos o subversivo Ivan Lins!”, pode ser dos mais insólitos exercícios.