terça-feira, 24 de abril de 2012

Um olho no peixe, outro no prato


Levon Helm (1940-2012) com The Band em 1970 (Foto: LA Times)

"Os bateristas me pediam para que lhes fizesse soar como Levon Helm, e eu respondia: 'para isso, você tem que tocar como o Levon Helm'", me disse em entrevista de 2008 o produtor americano Joe Boyd (Pink Floyd, Nick Drake, R.E.M.).

Falecido na quinta-feira passada em Nova York, aos 71 anos, em decorrência de um câncer na garganta, o multi-intrumentista e vocalista nascido no Arkansas foi, além da espinha dorsal de The Band e sonho de consumo de colegas dos tambores, o baterista-cantor definitivo. Tão definitivo que me inspirou a soltar uma lista que já estava praticamente pronta há tempos: a dos melhores singing drummers.

Aqueles que extrapolam os limites convencionais da coordenação motora, mantendo em grande estilo um olho no peixe e outro no gato. Ou, no caso, um olho no peixe e outro no prato. Sou baterista e me aventurei nisso em bandas da adolescência. Só que me via obrigado a balbuciar qualquer coisa, porque pronunciar letras, segurar a melodia e mexer pernas e braços em sincronia era demais para mim. Desisti.

Só valem, vejam bem, os conhecidos por tocar simultaneamente à cantoria pelo menos em alguma fase da carreira, e não bateras que simplesmente largaram as baquetas rumo ao microfone, tampouco artistas “faz-tudo” frequentemente dados a bumbadas em estúdio (estes permanecem engavetados para outros rankings).

A boa notícia é que nas próximas linhas há uma honesta dose de música de primeira qualidade e algumas surpresas; a má é que vocês já sabem quem ficou com o primeiro lugar.

10-Marylise Frecheville (Vialka)

A mais técnica. E doentia, absolutamente doentia, como o som do duo francês Vialka.


9-Robert Wyatt (Soft Machine)

O mais experimental... e azarado. Antes de cair da janela em uma festa em 1973 e ficar paraplégico, o genial Robert barbarizava com gogó e membros em meio à miscelânea sydbarretiana do Soft Machine. No meio da qual enfiava seus inconfundíveis sussurros em falsete.

8-Karen Carpenter (Carpenters)

A mais surpreendente. Afinal, nem todo mundo sabe que a dona de uma das duas vozes irresistivelmente água-com-açúcar dos irmãos Carpenters era também uma destas bateristas classicamente virtuosas, formada em escola jazzística. E que não tinha problema algum em cantar enquanto rufava.

7-Grant Hart (Hüsker Dü)

O mais objetivo. Algo que contribuía em muito para fechar a sonoridade compacta e eficiente de uma das melhores bandas americanas dos anos 1980. Compositor prolífico, Hart não abria mão de cantar suas próprias canções, o que dava ao Hüsker Dü uma interessante dualidade Lennon-McCartney - o outro criador, Bob Mould, tinha estilo bem diferente. Hart assume o microfone no tempo 5’30” do vídeo, após constrangedora entrevista com espécie de Hebe americana.

6-Phil Collins (Genesis)

O caso mais careca, o mais zoado, o que provavelmente mais sofreu bullying na escola – mas também um dos que melhor exerceram o ofício percussivo-vocal. Reparem: o groove de “No Reply At All” é da pesada. A música toda, na verdade, incluindo a melodia da voz.

5-Ringo Starr (Beatles)

O mais clássico. Como não amar Ringo?

4-Georgia Hubley (Yo La Tengo)

A mais eficiente, para a proposta indie atmosférica do fundamental trio. E a mais fofa – em um show aqui em Barcelona, uma garota da plateia lhe pediu um abraço. Foi prontamente atendida. Canhota, como o careca Phil Collins, e possuidora de um gogó embalador de bons sonhos.

3- Curumin

O mais malandro. Capaz de brincar de Stevie Wonder ao cantarolar e manter o suíngue baterístico no mesmo nível, encaixando viradas como se nada estivesse acontecendo e lançando melodias no MPC. Se jogarem uma bola no palco, ainda desenrola uma embaixadinha de cabeça.

2-Buddy Miles

O com mais pegada. E presença. E vozeirão. Jimi Hendrix e Carlos Santana, que tiveram bandas com o finado colosso, ficavam pianinho quando ele sentava no banquinho.

1-Levon Helm  (The Band)

O definitivo, repito. Como vocalista, se tornou referência pelo timbre áspero e cheio de sentimento, puxado em country e gospel; com as baquetas na mão, dosava à perfeição suíngue, criatividade, pegada e economia de notas. Um ingrediente dominado por poucos de seus colegas, diga-se. Manejando todos estes talentos ao mesmo tempo, era imbatível. 

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segunda-feira, 9 de abril de 2012

De volta à mesa



No fim do ano passado, celebramos a curiosa mania de nos empanturrar em grandes festividades com os melhores clipes em que os artistas comem.
Como na Páscoa não é muito diferente – a minha não foi -, acho que vale voltar ao assunto, resgatando outra fascinante espécie de tributo pop aos glutões: as 10 melhores capas de discos com artistas comendo. Bom apetite.
*Não valem as que trazem comida, mas sem os autores traçando nada. A clássica dos Secos e Molhados, por exemplo, fica para outro post.

10-New York Dolls – “‘Cause I Sez So” (2009)


Para quem vem de décadas de atividade junkie, a pinta dos Dolls no século 21 não está mal. Parece até que eles chegaram a encostar na comida.

9-Undertones – “Hypnotized” (1980)


Fã de Undertones que é fã de Undertones só usa babador estampado com lagosta. Autografado, se possível.

8-George Benson – “Giblet Gravy” (1968)


Babador que, aliás, não seria má ideia para Benson. Ele acaba de jantar o seu prato e agora planeja fazer a mesma coisa com a moça, enquanto sorve um café com olhar canalha de quem vinte anos depois sobreviveria às custas de “Kisses in the Moonlight”.

7-Gilberto Gil – “Refazenda” (1975)


Ah, os anos 70... a época dourada em que convencer executivos de uma gravadora a posar na capa com roupão de motel, comendo sushi, era algo totalmente corriqueiro.

6-Leonard Cohen – “I’m Your Man” (1988)


Ser Leonard Cohen é assim: você tem tanta moral depois de compor uma canção como “I’m Your Man” que até uma imagem sua comendo banana pega bem.

5-Sá e Guarabyra – “Pirão de Peixe com Pimenta” (1977)


No transe da moqueca, Guarabyra já está naquela fase da gengiva anestesiada pela pimenta, avançando direto na travessa de pirão, sem colocar no prato.

4-The Damned – “Damned Damned Damned” (1977)


A dieta punk geração 77 se seguia à base de torta de creme com sabor de couro cabeludo. E muito cuspe.

3-Brother Jack McDuff  “Hot Barbeque” (1965)


O melhor é saber que McDuff tinha todo este apetite para tocar seu órgão Hammond.

2-Jimmy Smith & Wes Montgomery – “Jimmy & Wes: The Dynamic Duo (1968)


E se um jazzista da pesada tirando a barriga da miséria já causa grande estrago, imaginem dois.

1-Ike & Tina Turner “Outta Season” (1969)


Não pude confirmar 100%, mas me parece que a primeira edição deste álbum não trazia duas capas diferentes, mas sim Ike na frente e Tina no verso. 


O que bate com o estilo “macho alfa” do cara. Lugar de mulher, segundo Ike, era na cama, na cozinha e... na contracapa.

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