quinta-feira, 30 de setembro de 2010

Urnas Pop



Tiririca, Tati Quebra-Barraco, Reginaldo Rossi... a lista de pitorescas celebridades musicais brasileiras que disputarão as eleições deste fim de semana vai longe. E, se na grande maioria dos casos atuais as candidaturas é pura esculhambação e uma chance de ouro de garantir aos pretendentes gordos salários pelos próximos quatro anos, não foi sempre que a aspiração de músicos a cargos políticos serviu apenas para tiração de sarro.



Para não perder o embalo eleitoral, o blog faz portanto boca-de-urna para o PLO (Partido das Listas Obsessivas) na forma de um top 10 músicos que se meteram com política, no Brasil e em outros países. Eles aparecem por ordem de relevância do cargo – Tim Maia como síndico de prédio não conta -, partindo dos que tentaram e não conseguiram aos que de fato lograram ser chamados de “Vossa Excelência”, passando pelos que ainda têm boas chances de aplicar o golpe do paletó na cadeira.





10-Wyclef Jean




Nascido no Haiti, o rapper teve seu pedido para concorrer à presidência do sofrido país caribenho negado no mês passado. O motivo: não cumpria o requisitado básico de ter vivido os últimos cinco anos em território haitiano. Também não ajudou o fato de não falar os idiomas locais, francês e creóle.





9-Fela Kuti





Mais um que teve a candidatura à presidência de seu país – no caso, a Nigéria – negada. Só que os motivos para a proibição, determinada nas eleições de 1979, eram bem mais complicados, já que Fela vinha em pé de guerra com a ditadura militar nigeriana havia uma década. Inclusive com episódios tenebrosos como a invasão de mil soldados à megacomunidade alternativa que fundou, batizada Kalakuta Republic, resultante em um brutal espancamento a Fela, a destruição de seu estúdio e a morte de sua mãe de 82 anos, atirada escada abaixo pelos milicos.



Massacres à parte, fico imaginando se o gênio criador do afrobeat tivesse sido liberado para o pleito de 1979, e se naquela época na Nigéria ocorressem debates televisivos como os de agora. Precisando dos votos da ala mais conservadora, o candidato de oposição perguntaria: “Senhor Kuti, como o senhor se pronuncia sobre o fato de ser casado com 27 mulheres, transportar metade delas numa Kombi e conceder entrevistas sentado numa poltrona velha, de sunga e com um baseado aceso nos dedos?”.





8-Jello Biafra (Dead Kennedys)




A ferramenta lírica dos Dead Kennedys sempre foi a ironia pesada (“I Kill Children” e “Kill the Poor” estão entre os títulos de suas canções). Não surpreendeu a seus fãs, portanto, quando o vocalista Jello Biafra se lançou como candidato à prefeitura de San Francisco, em 1979, tendo como propostas de campanha medidas como leiloar cargos públicos e obrigar homens de negócios a vestirem roupas de palhaço. Surpresa mesmo teve o próprio Biafra ao receber 6,591 votos, quase 3% do total, ficando em quarto lugar.



Mais sérias, no entanto, foram suas posteriores pretensões presidenciais, que o levaram a disputar – e perder - as primárias pelo Partido Verde americano dos EUA nas eleições de 2000. Há quem diga que ele voltará a tentar.




7-Leci Brandão





Quando não está cantando ou comentando desfiles das escolas de samba no Carnaval da Rede Globo – algo que faz desde 2003 – a sambista carioca gosta de atuar politicamente. Integra o Conselho Nacional de Promoção da Igualdade Racial e o Conselho Nacional dos Direitos da Mulher, e agora quer ser deputada estadual por São Paulo, pelo PC do B. Das “candidaturas musicais” do Brasil 2010, parecer ser a mais séria.




6- Feargal Sharkey (Undertones)





Não é fácil saltar do circuito punk norte-irlandês para a Câmara dos Lordes, uma espécie de parlamento especial que existe no Reino Unido há mais de 500 anos. Pois Feargal Sharley, o ex-vocalista dos Undertones está prestes a realizar tal proeza, já que os jornais britânicos dão como certa sua condecoração por parte do primeiro-ministro David Cameron. Muito além dos serviços prestados à juventude britânica do final dos anos 1970, que pulou ao som de sua “Teenage Kicks”, a reverência a Sharley vem de seu papel pós-carreira musical, que começou com seu posto de diretor na gravadora Polydor e passou pelo comando de entidades como a British Music Rights, que representa interesses Indústria Musical Britânica.





5-Krist Novoselic (Nirvana)





Como milhões de pessoas, vi ao vivo pela MTV Brasil Novoselic atirando seu baixo para o alto e não se mover do lugar durante a performance do Nirvana no VMAs 1992. Como milhões de pessoas também, em nenhuma hipótese imaginei que aquele grandalhão (então) magrelo pudesse ter preocupações mais nobres do que rachar o próprio côco, como fez naquela noite.



Mas Novoselic, filho de imigrantes croatas, já naqueles tempos mexia seus pauzinhos, organizando concertos beneficentes a mulheres bósnias vítimas de estupro no conflito da partilha da Iugoslávia. Também viria a combater órgãos censores e protestar contra a World Trade Organization em Seattle, além de lançar o livro "Of Grunge & Government: Let's Fix This Broken Democracy!” (2004). É diretor da Fair Vote, entidade que propaga o “hábito” de votar nos EUA, e bastante ativo na política do estado americano de Washington (ocupou o cargo de “state comiteeman”, espécie de deputado, e cogitou concorrer ao governo). Novoselic inaugura nesta lista a facção dos que, mais além de simplesmente tentar, já ocuparam algum cargo.





4-Vinicius de Moraes





Antes de ser conhecido como brilhante poeta e compositor que recebia visitas na banheira, Vinicus já colecionava baladas (e, sobretudo, mulheres) dos tempos em que foi vice-cônsul brasileiro em Los Angeles e ocupou cargos nas embaixadas do país em Paris e Roma. Até que, parodiando a letra de “O Pato Pateta”, o clássico infantil que o próprio escreveu com Toquinho, “tantas fez o moço que foi pra panela”: cansado da boemia do Poetinha, o ditador vigente Costa e Silva mandou dar cabo de sua carreira no Itamaraty. Segundo o sensacional livro de Ruy Castro, “Chega de Saudade” (1990), o recado do presidente ao chefe de Vinicius continha somente três palavras: “demita este vagabundo”.







3-Agnaldo Timóteo





Num exemplo perfeito de como funciona a fidelidade partidária no Brasil, o cantor romântico e ex-participante da “Casa dos Artistas” já apoiou Leonel Brizola, Paulo Maluf e Luiz Inácio Lula da Silva. Seu eleitorado não parece se importar com a promiscuidade, já que o mineiro recebeu incríveis 600 mil votos para deputado federal pelo Rio de Janeiro em 1982, cargo que renovou em 1994. Também disputou o governo fluminense e foi eleito vereador por São Paulo em 2005. Agora quer ser deputado federal pelo mesmo estado.







2-Sonny Bono (Sonny & Cher)





Cansado de ser passado para trás por sua eterna esposa/parceira Cher, Sonny Bono (1935-1998) largou a música para abrir seu próprio restaurante italiano em Palm Springs, Califórnia. A prefeitura da cidade não quis liberar a licença, algo que transtornou Bono a tal ponto de ele resolver concorrer ao cargo, filiando-se à força mais conservadora americana, o Partido Republicano. E não é que ganhou? Entre 1988 e 1992, vestiu terno e trocou os chifres, quer dizer, o cabelo tigela por um bigode de amante latino para ir ao trabalho. Se animou tanto com a nova vida que depois se candidatou pela Califórnia ao senado, fracassando, e depois ao congresso, triunfando.







1-Gilberto Gil




Ele flertava com política em suas canções desde os anos 1960, e em 1989 entrou para o ramo propriamente dito ao ser eleito vereador por Salvador (pelo PMDB, partido que ainda tinha certa moral naqueles dias). O cargo de Ministro da Cultura entre 2003 e 2008 em um país que exporta produção cultural aos borbotões vai para o trono em termos de “responsa” nesta lista.



Há quem aponte como acertos do ministro alguns progressos na democratização da tecnologia em pontos de cultura; outros criticaram as proporções entre o trabalho no Ministério e a carreira de músico em sua agenda. Vale uma análise mais a fundo para especialistas em política. Mas que Gil poderia ter se esforçado mais seriamente para acabar com a decrépita, imoral, inútil, putrefata e opressora Ordem dos Músicos do Brasil, ah, ele poderia.




segunda-feira, 20 de setembro de 2010

Antes que se queimem



“A proibição de fumar em locais de ócio fará com que fechem mais locais. Defenda a noite”. A mensagem em catalão do cartaz registrado pela dama Anita Cortizas nesta foto mostra o quanto uma parte dos espanhois está radiante, saltitante de alegria com o fecho de cerco da União Europeia aos fumantes. O bloco quer que até 2012 todos seus países tenham abolido o consumo de tabaco em locais fechados. Não sei se eu, um não fumante, ainda estarei vivendo em Barcelona para ver o milagre acontecer. Bem que poderia ser agora: com nosso pequeno André ainda completando três meses, temos que riscar uns 80% de botecos e restaurantes de nossa lista.


Os leitores brasileiros, especialmente os de São Paulo, perceberão que, no quesito antitabagismo, a Espanha está “roendo pedra nas cavernas”, como definiria Nelson Rodrigues. Por aqui todo mundo fuma como chaminé, não importa o tamanho do lugar. Os muitos estabelecimentos com terraço são uma opção, mas não raramente absolutamente todas as mesas ao redor estão ocupadas por fumantes tipo Geraldão, que parecem estar com três pitis na boca.


Na Espanha a previsão é de que, mesmo com a aguardada proibição, em locais com varandas ou espaços públicos não cobertos ainda será permitido fumar. Por mim tudo bem. Achei a lei de São Paulo um pouco radical com o veto aos tragos nos terraços que não sejam abertos. Seguindo assim, o próximo passo será promover a grande queima de qualquer referência a cigarros, de painéis publicitários a filmes hollywoodianos, passando pelas capas do disco.


Por isso, enquanto ainda não pega totalmente mal estampá-las com os próprios artistas fumando, vai aqui um top 10 com os melhores exemplares do gênero.


*Menção honrosa para “Soul Mining”, do The The, e “Whatever People Say I Am That's What I'm Not”, do Arctic Monkeys. Impactantes demais, mas protagonizadas por coadjuvantes fumando.



10-Thelonious Monk – “The Man I Love” (1971)


Já vou avisando que esta será uma lista com forte presença de jazzistas lendários dos anos 1940 e 1950, o supra-sumo do cool estético envolvendo cigarros, juntamente com os filmes do mesmo período. Então nada melhor do que começar com Monk.



9-Leonard Cohen – “Live Songs” (1973)



Por falar em cool, poucos podem sê-lo mais do que o senhor Cohen. Ou podem?



8-David Bowie – “Young Americans” (1975)



O Bowie dos anos 1970 foi tão, mas tão positivamente prolífico – sua série de discos naquela década, como a de Stevie Wonder, é de uma fartura comparável a Beatles – que o cara arrumava tempo para criar uma “fase entre fases”. Ou seja, entre os míticos períodos de androginia glam (mais ou menos 1972-1974) e o genial futurismo de vanguarda (1976-1980), ele arrumou tempo para tentar bancar um soulman inglês e branco com este álbum. E ainda conseguiu dar uma pausa para um “careta”.


7-Gal Costa – “Lua de Mel como o Diabo Gosta” (1987)



Como vimos no post Barcelona Muitos Graus – Parte II, houve um tempo que Gal Costa mandava bem nas capas. Eis outro exemplo.



6-Grace Jones – “Nightclubbing” (1981)



 O brilho da pele, o cabelo, o corpo e o olhar de Grace Jones sempre chocaram. A ponto de que uma foto como esta me faça pensar na possibilidade de terem utilizado um boneco no lugar da ex-modelo. E que, no canto da boca, tenham feito um buraco para encaixar o cigarrão.


5-Frank Sinatra – “In The Wee Small Hours” (1955)


Consultado frequentemente por este blogueiro, o recomendadíssimo livro “1001 Discos Para Ouvir Antes de Morrer”, lançado no Brasil pela GMT, tem seu marco zero neste disco. O editor Robert Dimery considerou que a bolacha foi pioneira no uso do espaço de um álbum para a realização de um trabalho conceitual de artista. Ou seja, o álbum passava a não ser mais necessariamente um acumulado de singles, um mero “greatest hits”. Como que antevendo o momento histórico, o Blue Eyes posou segurando o fiel companheiro com a maior classe que seus dedos puderam oferecer.


4-Billy Strayhorn - “The Peaceful Side of Jazz” (1961)


Também visitado muitas vezes pelo Mala da Lista, o blog LP Cover Lover garimpa a fundo (às vezes até demais) em busca de capas interessantes. Foi lá que me deparei com esta peça criada por um dos segredos mais bem guardados do jazz – Strayhorn era o braço direito do maior compositor do gênero, Duke Ellington.


3- Dexter Gordon – “Dexter Blows Hot and Cool” (1955)



Haja estilo. Não bastando ser um dos mais elegantes músicos que já sopraram um sax tenor em todos os tempos, Dexter conseguia fazer de seus cigarros um objeto de fetiche de dar inveja até a não fumantes. Há pelo menos três capas “esfumaçadas” em sua discografia, e está é a melhor.



2-Antônio Carlos Jobim – “Stone Flower” (1970)



Os americanos souberam trabalhar a imagem de Tom Jobim na hora de produzir seus discos para seu mercado interno. Assim, uma tragada com estilo só serviu para reforçar a fama do maestro bon vivant carioca e galã.


1-Lester Young, Roy Eldridge and Harry Edison – “Laughin’ to Keep From Cryin’” (1958)



"Duele de tan cool", diriam os espanhois. Pois Lester Young era tão, mas tão cool, que para interpretar um personagem parcialmente inspirado nele no filme “Round Midnight” (1986), chamaram ninguém menos que o Dexter Gordon aí acima. De quebra, Young (o que na foto porta o cigarro, é claro), era o melhor amigo de Billie Holiday e ídolo de escritores beat como Jack Kerouac.